Friday, February 26, 2010

Obras de Teodoro Sampaio

Mulato, filho de mãe escrava, o engenheiro baiano Teodoro Sampaio (1855-1937) conquistaria, no entanto, um papel de destaque entre a intelectualidade brasileira na última década do Império e na República Velha. Formado em 1877, participaria de expedições ao sertão nordestino (1879-80) e ao interior paulista (1886), pondo em prática seus talentos como cartógrafo e como observador atento da paisagem natural e humana. Relatos destas viagens, os livros O Rio de S. Francisco e a Chapada Diamantina (1905) e Considerações geographicas e economicas sobre o Valle do Rio Paranapanema (1890) contêm preciosas informações sobre as populações locais.

Teodoro Sampaio interessou-se também pela história, a etnografia e a lingüística. Seu livro sobre o vale do Paranapanema (Sampaio 1890) inclui, além de informações ligeiras sobre os Otí e os Kaingáng, um vocabulário da língua dos Kaiowá, povo com que conviveu mais de perto. Também investigou a posição etnográfica dos antigos "Guayanã" da capitania de São Vicente (Sampaio 1897). Sua obra mais importante, no entanto, seria o estudo toponímico O Tupi na Geographia Nacional (1901), ressaltando o papel dos bandeirantes na difusão de topônimos de origem Tupí. Tendo servido de subsídio (se não inspiração) a autores como Sérgio Buarque de Hollanda, é um livro que -- na opinião do Pe. Lemos Barbosa (1967) -- "apesar de suas fantasiosas 'etimologias', não pode ser estranho a nenhum interessado pelo assunto."

Estas obras de Teodoro Sampaio estão agora disponíveis na Biblioteca Digital Curt Nimuendaju, podendo ser acessadas através da página do autor.

Teodoro Sampaio, desenhista

Vários desenhos e notas de campo resultantes da expedição ao Rio São Francisco permanecem inéditos. É o caso do desenho ao lado, retratando um indivíduo "Procká", "tipo de índio domesticado" (1879). Tais desenhos, acompanhados de observações sobre a população da região (incluindo índios e descendentes de índios), estão contidos nos cadernos de campo do autor, que compõem o Arquivo Theodoro Sampaio do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Este material é analisado na dissertação de mestrado de Ivoneide de França Costa (2007), O rio São Francisco e a Chapada Diamantina nos desenhos de Teodoro Sampaio [PDF, 6.39 MB] (Universidade Federal da Bahia/Universidade Estadual de Feira de Santana).

Teodoro e Euclides

Como profundo conhecedor da geografia sertaneja, Teodoro Sampaio forneceria informações cruciais para a obra-prima de seu amigo Euclides da Cunha, Os Sertões. É o que explica Gilberto Freyre (2002) no artigo 'Perfil de Euclides da Cunha' (Revista Brasileira, Fase VII, Ano VIII, No. 30, p. 29-36).

Thursday, February 25, 2010

Piratas, canibais — e monstros?

Para os moradores dos primeiros núcleos coloniais na costa brasileira, como Santos e Cabo Frio, a pirataria era ameaça constante. Mas a vida de pirata, por outro lado, também não era nada fácil, a julgar pelos relatos de protagonistas como o inglês Anthony Knivet. Disponível agora na Biblioteca Digital Curt Nimuendaju, a obra 'Notavel viagem que, no anno de 1591 e seguintes, fez Antonio Knivet, da Inglaterra ao mar do sul, em companhia de Thomas Candish' pinta uma imagem um tanto anti-hollywoodiana de pirata: faminto, maltrapilho, infestado de piolhos, vivendo da pilhagem da mandioca alheia.

Eventualmente capturado e escravizado pelos portugueses, vivendo, segundo sua descrição, a pauladas e sob constante ameaça de morte, Knivet acompanharia seus amos em viagens de exploração pelo interior do sudeste brasileiro (e, depois, o nordeste), travando contatos com índios de diversas etnias, como os Tamoyo (entre os quais presenciaria rituais canibalísticos) e os Purí. Assim, além de retratar a colonização portuguesa sob uma pespectiva diferente da habitual, seu relato contém informações úteis sobre costumes indígenas e sobre a localização geográfica de diversas tribos, apesar de algumas passagens pouco plausíveis -- como o encontro com um monstro aquático que "tinha no dorso grandes escamas medonhas e não menores garras e uma comprida cauda, (...) [e] uma comprida lingua qual harpão".

O texto foi traduzido por J. H. Duarte Pereira a partir da versão holandesa, e publicado na Revista do Instituto Histórico e Geográfico em 1878.

Leia mais:

Hue, Sheila Moura. 2006. Ingleses no Brasil: relatos de viagem (1526-1608). Anais da Biblioteca Nacional, vol. 126, p. 7-68.

Friday, February 5, 2010

Historia Naturalis Brasiliae (Piso & Marcgrave 1648)

Um marco não apenas para os estudos da flora e da fauna, mas também para a etnografia e a etnolingüística dos povos originais do nordeste brasileiro, a obra Historia Naturalis Brasiliae (Piso & Marcgrave 1648) acaba de ser incluída na Biblioteca Digital Curt Nimuendaju.

Produzida sob os auspícios do conde João Maurício de Nassau, quando governador das possessões holandesas no nordeste brasileiro, a obra divide-se em duas partes. A primeira, de autoria do médico holandês Guilerme Piso, trata principalmente de doenças tropicais. A segunda, de autoria do naturalista alemão Jorge Marcgrave, trata da fauna e da flora da região (fornecendo seus nomes indígenas), além de descrever costumes indígenas (incluindo um vocabulário Tupinambá).

Como introdução a esta importante obra, os Cadernos de Etnolingüística acabam de publicar o artigo Alguns comentários à Historia Naturalis Brasiliae, da antropóloga Mariana Françozo (que se doutorou no ano passado na Unicamp com uma tese sobre a circulação de objetos e saberes no Atlântico holandês).

A obra foi digitalizada pela biblioteca do Missouri Botanical Garden a partir de original em sua coleção de obras raras. Para a conveniência do leitor, a Biblioteca Digital Curt Nimuendaju adicionou "bookmarks" para cada um dos mais de 300 capítulos. Para uma breve introdução iconográfica à Historia Naturalis Brasiliae, visite nossa galeria no Flickr.