Sunday, April 18, 2021

Dia 18 de abril de 2020: Uma carta


Aldevan, Ana Carla, Kaina & Waina


Oi, eu não  sei se você  está  pescando lá  pelas bandas da Ilha Oscarina (Rio Negro), se você anda caçando ou andando de bicicleta.  Por onde está...

Nas "internets" e "redes sociais" deste outro plano de encantamento, não sei se você está acompanhando o que está  acontecendo pelas bandas de cá!!

As meninas e eu sempre falamos de você: quando assistimos a um filme; quando comemos peixe assado (e claro, nenhum é  igual  ao  seu); quando vemos alguma postagem sarcástica nas redes sociais; e sempre quando a campanhia toca por mais tempo do que deveria (pois você tinha mania de ficar segurando quando vinha nos visitar).

Apesar do cansaço  mental, da sensação  de impotência  e das dores das perdas (e olha, foram muitas), estamos bem!!! MAS  o Brasil, o Brasil:

  • Você  ainda estava entre nós quando o Mandeta saiu do ministério. Mesmo neste cenário de pandemia, já estamos com o quarto Ministro da Saúde;
  • O perfil  dos doentes de covid mudou, os pacientes agora são mais jovens;
  • Mesmo depois de 1 ano, continuanos usando máscara, mas ainda  existem pessoas que não acreditam na importância de seu uso;
  • Ainda não podemos aglomerar, abraçar ou encontrar as pessoas que gostamos;
  • Perdão, as meninas e eu ainda não conseguimos abraçar Sr. Emílio, Dona Joana Brazao, nossos sobrinhos(as), Tania Elias, Maria do Socorro Elias, Magson Jesus. 

Encontrei André Brazão e Lindomar Brazão na comunidade indígena Parque das Tribos,  por meio de um projeto de pesquisa de que estou participando. 

Vi Solange Brazão e nos abraçamos com os olhos quando Joanita precisou ser internada quando Manaus sufocava por falta de oxigênio. 

Sim, no dia 14 de janeiro, aqui em Manaus, vivenciamos um cenário de horror... pacientes de Covid morreram por falta de oxigênio nos hospitais. E agora, tristemente o Brasil todo está passando por situações similares...

Hoje, Manaus vive uma "amnésia coletiva", parece que a pandemia acabou... e as pessoas insistem nas baladinhas. Por outro lado, os profissionais da saúde continuam tentando salvar vidas neste cenário caótico... mas saiba, eles estão exaustos e precisando de afeto e respeito. 

Como eu poderia esquecer??? A Ciência e os cientistas venceram o tempo!!! Ao mesmo tempo, ambos sofrem com o negacionismo e as fake news. Mas temos VACINAS!! Mesmo com um número pequeno, devido a um "probleminha de gestão e diplomacia". Apesar disso, o sistema SUS (para o qual você trabalhava) está dando seu melhor.

Kaina, Wina e eu, logo que você se encantou, fizemos 1000 tsurus de origami pela cura do mundo.

Infelizmente, estamos vivenciando uma segunda onda:

  • Atualmente, em média, temos 3 mil mortes por dia;
  • Já atingimos mais de 370 mil mortos pela doença. Triste não é? 
  • Agora no domingo de Páscoa, Solange, Sr.Emílio e Magson fizeram uma surpresa: fizeram peixe e beiju para nós. Matamos a saudade de seu peixe. (Penso que cozinhar para o outro é uma demonstração de afeto)
  • Sim, como poderia esquecer? O livro Brilhos na Floresta já foi traduzido para Baniwa, uma das línguas Yanomami, Kaingang e Guarani, além de sua versão em Nheengatu e da tradução para Tukano, que você chegou a ver... 
  • Você conhece bem a nossa amiga Noemia Kazue Ishikawa, ainda estamos fazendo estripulias, pensando na década das Línguas Indígenas do Mundo, que será comemorada entre 2022 e 2032. Mas saiba, o grupo de pesquisa "Cogumelos da Amazônia" sente sua falta.

Não importa onde você esteja, suas filhas e eu esperamos que você esteja bem neste plano dos encantados.

Ana*, Kaina e Wina.

-----

*Ana Carla Bruno é antropóloga (INPA) e coordena, com Noemia Kazue Ishikawa (também do INPA), o Projeto Aldevan Baniwa.

2 comments:

  1. Histórias tristes e tristes com esta história.

    ReplyDelete
  2. Quando eu recuperar o ar

    ajudarei a assoprar

    ternas brisas

    e novos ventos.

    ReplyDelete