por Nelson Sanjad*
O “Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi” é um dos mais antigos periódicos científicos do país. Criado em 1894, com o título de “Boletim do Museu Paraense de História Natural e Ethnographia”, sua trajetória centenária confunde-se com a própria constituição do campo científico no Brasil, que ajudou a formar e consolidar. Atualmente, é publicado em duas versões: Ciências Naturais (ISSN 1981-8114) e Ciências Humanas (ISSN 1981-8122).
Desde 2006, quando foi reformulado, o boletim de Ciências Humanas possui uma política editorial que contempla – além de artigos originais – a publicação de fontes históricas, sejam textuais ou iconográficas (inclusive em cores), biografias, obituários, memórias, traduções e relatos diversos que tenham como finalidade divulgar trajetórias pessoais, acervos ou pesquisas. A partir de dezembro de 2008, a seção “Memória” segue publicando, ininterruptamente, textos e imagens de interesse para historiadores, antropólogos, arqueólogos e linguistas.
Vale mencionar, por exemplo, o relato do frei Francisco de São Manços (1728) sobre os índios dos rios Trombetas-Mapuera e a análise desse texto feita por Antonio Porro; o relato de Lourens Lourenszoon sobre os índios da costa da Guiana (1618-1625) e os comentários feitos por Neil Whitehead e Martijn van den Bel; os textos de Giovanni Angelo Brunelli (1722-1804) sobre a região amazônica, compilados, traduzidos e comentados por Nelson Papavero e colaboradores (incluindo interessantíssimas memórias sobre a pororoca e sobre a mandioca e seus usos, ambas datadas de 1767); e um confessionário jesuítico anônimo, escrito no Pará em 1751, analisado por Maria Cândida Barros e Vitor Fonseca.
Entre as fontes iconográficas, destacam-se as 20 litogravuras elaboradas por Emílio Goeldi e Gottfried Hagmann, contendo imagens do acervo arqueológico e etnográfico do Museu Goeldi, que permaneceram inéditas por mais de cem anos; as fotografias tiradas por Jacques Huber em sua célebre viagem ao Oriente, realizada entre 1911 e 1912, para conhecer as plantações de seringueiras feitas pelos ingleses em suas colônias; e as estampas de George Catlin (1796-1872) sobre índios amazônicos, acompanhadas dos relatos das viagens deste pouco conhecido pintor, coligidos, traduzidos e comentados por Antonio Porro.
Em um país com pouca tradição na publicação de fontes históricas, o boletim do Museu Goeldi procura valorizar e divulgar documentos e acervos que possam se constituir em objetos de estudo ou que tornem mais complexa e rica a história das ideias e do conhecimento científico no Brasil, ou ainda que permitam reflexões teóricas e epistemológicas sobre o próprio estatuto das ciências humanas. Essa política também contempla a publicação de estudos originais em antropologia, arqueologia, linguística indígena e disciplinas correlatas, formando um conjunto apreciável de textos – capazes de projetar o conhecimento em direção ao futuro e estimular a contínua (e necessária) visita ao passado.
Essa e outras características distinguem o “Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas” no cenário editorial brasileiro. Além de ter ajudado na consolidação do campo antropológico por meio da publicação de trabalhos considerados atualmente clássicos na literatura científica, a revista encontra-se, atualmente, em uma fase promissora. Possui qualidade gráfica, editorial e científica, reconhecida por meio da participação de bons autores e da indexação na coleção DOAJ e na coleção SciELO Brasil. O Boletim permanece como o único título dessa coleção (238 revistas em setembro de 2011) cuja missão declarada é publicar trabalhos originais nas áreas de arqueologia e linguística indígena, o que lhe garante visibilidade nas respectivas áreas. Em 2010, voltou a ter o apoio do CNPq e da CAPES. Neste ano, a indexação do Boletim foi aceita pela base SCOPUS, o que certamente lhe lançará novos desafios.
Para conhecer mais sobre a revista, visite o site da editora do Museu Goeldi e a página do Boletim no SciELo Brasil.
* Nelson Sanjad [perfil] é doutor em História das Ciências e da Saúde pela Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro. Pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi/MCT. Editor científico do “Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas”. Membro da Diretoria 2010-2012 da Sociedade Brasileira de História da Ciência.
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